Flauzino Antunes: ‘austericídio é entrave para o desenvolvimento econômico’

4/04/2023 | 06:44



Dirigente da CSPB com formação em Economia analisa aspectos o Arcabouço Fiscal apresentado pelo Ministério da Fazenda em conjunto com o Ministério do Planejamento. Líder sindical aponta insuficiências da proposta, mas reconhece limites políticos para assegurar governabilidade junto a um Congresso Nacional reacionário

 
Com formação em Economia, Flauzino Antunes é Diretor Adjunto de Política Ambiental e Economia Sustentável da CSPB


Nesta segunda-feira (03/04), o Diretor Adjunto de Política Ambiental e Economia Sustentável da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil – CSPB, Flauzino Antunes, concedeu entrevista à Secom/CSPB para tratar da Proposta de Arcabouço Fiscal apresentado pelo Ministério da Fazenda em conjunto com o Ministério do Planejamento (saiba mais). O líder sindical aponta insuficiências da proposta, mas reconhece limites políticos para assegurar governabilidade junto a um Congresso Nacional ainda mais reacionário do que aquele que viabilizou o golpe em 2016.


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Abaixo a íntegra da entrevista:
                      
                       
Secom/CSPB: O senhor considera que a proposta do novo Arcabouço Fiscal representa um avanço em relação à Emenda Constitucional 95 (do teto de gastos)? Em caso afirmativo, quais seriam os avanços que merecem ser destacados?

Flauzino Antunes: De maneira objetiva, sim. Foi um avanço limitado e tímido, em pelo menos dois aspectos: 1 - colocou uma banda, uma flexibilização de 2,5% e portanto não está congelado como a emenda 95, 2 - atrelou um mínimo de 06,% aumento independente na despesa e colocou a questão do aumento da despesa em relação o aumento de receita na ordem de 70%.  Essas mudanças se dão já num prisma menos ortodoxo da economia. Um senão importante no modelo desenhado é como conseguir aumentar a receita.

A dúvida é se seria realmente necessário apenas reformular a emenda 95 e tornar o teto de inflexível para flexível, ou o necessário era acabar de vez com essa politica fiscal austera que nos coloca cada vez mais no “austeríscidio fiscal”?

Acabar com a busca desenfreada por metas austeras produzidas por “cabeças de planilhas” que são financistas frios e não se importam com o país, e que no fim mata nosso desenvolvimento econômico e o nosso povo. Sim seria o ideal! Mas teríamos correlação de força politica para retirar de vez?



Diante de um governo que se elegeu por conta de uma ampla aliança política, que reuniu quadros de diversos segmentos ideológicos - tanto na esquerda como na direita do espectro político – o senhor avalia o novo Arcabouço Fiscal uma proposta equilibrada ou muito pendente aos interesses do “mercado”?

Esse é o ponto! Lula se elegeu com uma ampla aliança política e com interesses e visões distintas. Dentro dessas contradições internas nasceu esse novo arcabouço fiscal. Mas ao meu ver foi ainda inclinado aos interesses do mercado. Pois o próprio mercado tinha dado sinais que esperavam mais tempo para alcançar o nível de superávit fiscal, e o governo apresentou que em dois anos estarão com o superávit. O que pode mudar nessa equação de contradições internas são os resultados políticos! Lula pra além da frente ampla, contou com o apoio dos eleitores e do povo em geral, que esperam a volta dos investimentos e politicas públicas, a volta dos empregos. Isso só ocorrerá com a queda dessa politica monetária austera do BC de juros altos e do fim do freio da politica fiscal (Teto) com superavit fiscal, para que tenhamos mais investimentos. Se em curto e médio prazo o povo perder as esperanças e começar a cobrar o Governo, este terá que fazer uma reflexão com quem quer governar.

Lula terá que optar entre o POVO ou MERCADO, pois nesse momento de reconstrução nacional pós-pandêmico e de um governo devastador e entreguista como o passado, essas bandas flexíveis do Haddad, serão um entrave, à política fiscal tem que ser anticíclica. Vincular o crescimento da despesa ao aumento de receita é justamente pró-cíclico, apesar de que há um piso os investimentos, mas ainda é pouco.

Outro ponto importante será a disputa interna por recursos dentro das pautas sociais dentro do orçamento público desse modelo proposto, com o máximo que a despesa pode crescer entre um ano e outro, que é de 2,5%. Esta será a despesa total da União. Só que no gasto total da União estão os gastos previdenciários. Então, para respeitar o teto da banda, os outros itens da despesa deverão crescer menos. E quais os outros itens? Você tem dois que são fundamentais, são a despesa com o funcionalismo público e os de investimento. Num processo de retomada essas rubricas não deveriam ser limitadas, tão pouco conflitantes para serem escolhidas entre uma ou outra.

O modelo que o povo mais anseia é do desenvolvimento econômico com inclusão social, para isso os investimentos e politicas públicas deveriam estar fora dessas amarras fora do teto, e o BC deveria estar com o Estado para remar na mesma direção.



Sabidamente o Congresso Nacional eleito em 2022 é ainda mais reacionário do que anterior. É possível que a proposta do governo seja alterada para pior, ampliando os prejuízos aos trabalhadores e cidadãos contribuintes?

É possível sim! Mas tem quem aposte que o governo apresentou aumento de 70% das despesas com relação da receita para que haja esse debate e negociação no parlamento. Terão as bancadas dos bancos querendo reduzir para 60 e outras bancadas querendo aumentar 80, nesse caso continuo apostando na opinião pública e nos movimentos populares para garantir os avanços e desequilibrar as forças politicas. 


Uma auditora cidadã da dívida pública permanece sendo negligenciada nessas discussões, mesmo com essa dívida abocanhando mais de 50% do orçamento da União anualmente. Todos os mecanismos de “controle fiscal” até aqui apresentados só anunciam cortes nas despesas com serviços públicos e políticas públicas sociais, poupando as despesas financeiras de qualquer questionamento. Como mudar esse cenário?

A politica neoliberal preconiza sempre a redução das despesas fiscais (investimentos e politicas públicas) e tamanho do Estado, mas não está preocupada com as despesas públicas nominais que são os gastos com os juros, pois favorecem os bancos e rentistas. Portanto, auditar esses gastos nunca teve na pauta. Seria muito importante a auditoria da dívida, para ver as contas da ditadura, bem como de outros governos que estão nesse bolo que podem estar até quitadas mas ainda estamos pagando. Mudaremos essa situação se realmente quisermos como sociedade apurar esses dados.


O presidente Lula segue fazendo frequentes críticas à taxa de juros praticada no país. Na sua avaliação, apoiar o presidente nesse embate com o Banco Central colabora para que discussão econômica figure finalmente entre os assuntos de maior interesse social?

Com toda a certeza, temos que apoiá-lo !

Nos últimos anos fomos pautados pela necessidade de um teto de gastos que nunca foi imprescindível. No governo FHC não tinha teto, no Lula também. A despesa pública no governo Lula cresceu em torno de 5% ao ano em termos reais, o resultado foi que o  superávit primário aumentou e a dívida caiu.

Não estamos com impressão desenfreada de moeda e as contas públicas não estão desequilibradas, só ver que a nossa relação dívida/PIB está no patamar de 76%, países desenvolvidos estão em mais de 100% e países do mesmo patamar econômico do Brasil estão em 80 a 90 % . Portanto, nãos são essas coisas que aumentam a inflação, então nada justifica o juros pornográficos que estamos vivendo no Brasil.

Essa postura do Lula coloca o tema em pauta. E o povo acaba buscando o entendimento que o BC independente não é necessário para o Brasil. Enquanto Roberto Campos Neto estiver à frente do BC, o arcabouço do Governo não o sensibilizará para uma forte redução da taxa de juros, e os planos do Palácio do Planalto não serão implementados.


É importante o movimento social, principalmente o sindical, do Brasil, assuma a vanguarda na luta pela redução da taxa de juros, pois isso representa mais emprego e mais cidadania.


Quais seriam suas sugestões para que o movimento sindical possa ampliar sua capacidade de intervenção nos temas econômicos? Como pressionar o parlamento brasileiro a abandonar agendas reacionárias que impedem avanços econômicos e sociais no país?

A primeira sugestão é a unidade pelo certo!

O certo agora e que o governo consiga garantir cidadania, emprego e democracia ao nosso país.  Deixar as divergências de lado e estarem engajadas no principal.

Para isso o foco da luta tem que ser na defesa da politica econômica do crescimento econômico e geração de emprego. Para isso o Sistema Confederativo e as Centrais tem que ir às ruas unidas defendendo a queda dos juros!

Puxando a pauta para o meio da sociedade e do povo, contribuindo na defesa das empresas nacionais e dando força ao esforço do Lula. Precisamos fazer com que o Congresso Nacional mude o “tom da musica” a favor do Brasil.




* Flauzino Antunes é formado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Paraná (UFPR)




Secom/CSPB

 
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